Embora Foucault (1996. p9) nos advirta que “não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa”, tomamos, ainda assim, a tolerância como uma prerrogativa constitucional imprescindível ignorada pelos principais partidos políticos. Isso se deve devido a natureza conflituosa do jogo político, que obriga as duas principais forças políticas ( MPLA vs UNITA) a disputarem a Ordem do discurso.
O MPLA, partido-estado, detém o discurso oficial. A UNITA, principal partido na oposição, contrapõe o discurso oficial apontando as fissuras da governação. Ambos procuram impor a sua lógica discursiva sobre o povo, resumindo-se nisso o antagonismo entre ambos.
A Constituição da República de Angola, na primeira parte do nº 1. do Artigo 40.º , estabelece que “todos têm o direito de exprimir, divulgar e compartilhar livremente os seus pensamentos, as suas ideias e opiniões, pela palavra, imagem ou qualquer outro meio, bem como o direito”. Reforça no nº 2 do mesmo artigo que “ o exercício dos direitos e liberdades constantes do número anterior não pode ser impedido nem limitado por qualquer tipo ou forma de censura”.
Entretanto, hoje, os sujeitos perderam a possibilidade de discursar livremente. A sua fala é predeterminada pela ideologia. Todos pregam a intolerância. Um elogio a uma atitude positiva do governo é repudiada por militantes da oposição. O repúdio a uma acção negativa do governo conecta-nos imediatamente à oposição. Quer-se com isso dizer, que o discurso dialéctico e o discurso lógico são combatidos quando ferem expectativas partidárias e que hoje, segundo a lógica discursiva partidária, não há apartidários. O indivíduo pertence a este ou àquele partido.
A intolerância, na sociedade angolana, atingiu proporções tão alarmantes que quem, de forma autónoma, faz o uso da fala perde a sua condição de cidadão e vê-se na obrigação de hastear uma bandeira partidária. Todo o discurso sobre a evolução da socidade é entendido como uma escolha política.
Nos últimos anos, a ideia de povo tem sido obliterada e substituída pela ideia de militância partidária, ou seja, praticamente já não há povo, apenas militantes. Os conflitos político-partidários constituem factores de segregação social, impõem falas, anulam o discurso autónomo. Na esteira de Foucault (1996, p.9), à par da sexualidade, a política é, em nossos dias, a região “onde a grade é mais cerrada, onde os buracos negros se multiplicam “, ou seja, é um lugar de intolerâncias. E todos os espaços de produção de discurso dão-nos estas provas. Enquanto o discurso político-partidário imperar, não haverá progresso. O progresso vem da dialéctica que prega a tolerância e da lógica que empresta racionalidade às acções. Os outros dois discursos, o poético e o retórico, são importantes, mas não podem ser os predominantes. O primeiro gera devaneios; o segundo, sofismas. São meros artifícios decorativos.